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09 de Janeiro de 2025

Artigo - “Ainda Estou Aqui” e a Resolução n. 601/2024 do CNJ: tempo de corrigir a história

Por Karin Regina Rick Rosa

O registro civil das pessoas naturais está presente em uma das cenas mais importantes do premiado filme “Ainda Estou Aqui”, quando Eunice Paiva recebe a certidão de óbito de seu marido, Rubens Beyrodt Paiva, mais de vinte anos após o seu desaparecimento. Na certidão não consta a causa da morte, apenas uma observação nas averbações, do seu desaparecimento desde meados de 1971.

Agora, esse e muitos outros assentos serão retificados, de ofício, tendo em vista a recente resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicada em 13 de dezembro de 2024, que dispõe sobre o dever de reconhecer e retificar os assentos de óbito de todos os mortos e desaparecidos vítimas da ditadura militar, trazendo um avanço significativo nas políticas de memória e reparação no Brasil.

A normativa estabelece que as certidões de óbito das vítimas da ditadura militar (1964-1985) devem incluir a informação de que a causa da morte foi “não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964.” A medida, proposta pelo Ministério dos Direitos Humanos, visa corrigir registros que historicamente omitiram a responsabilidade do Estado nas mortes, como no caso de Rubens Paiva, configurando um passo importante para reconhecer as violações de direitos humanos e promover a verdade histórica, conforme recomendado pela Comissão Nacional da Verdade (CNV).

A informação nas certidões é um ato simbólico, que tem por objetivo restaurar a dignidade das vítimas e suas famílias, permitindo que os familiares tenham acesso à verdade sobre o passado e que reescrevam suas narrativas de dor e injustiça. A resolução determina que os cartórios realizem essas alterações independentemente de requerimento e gratuitamente, facilitando o processo para as famílias afetadas.

O procedimento de retificação administrativa dos assentos de óbito das vítimas da ditadura militar será realizado a partir do envio dos dados da Comissão Nacional da Verdade (CNV) pelo Conselho Nacional de Justiça aos registradores civis por meio do Operador Nacional do Registro Civil das Pessoas Naturais (ONR-RCPN). Os cartórios receberão as informações sistematizadas pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), que incluem a declaração de que a causa da morte foi “não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964.”

A entrega das novas certidões em cerimônias solenes reforça o valor da memória coletiva e a importância do direito à verdade.

Karin Regina Rick Rosa é advogada. Mestre em Direito pela Universidade Unisinos. Especialista em Direito Processual Civil. Professora de Direito Civil e Direito Notarial e Registral. Membro da Academia Notarial Brasileira - Cadeira nº 38. Membro da diretoria executiva do IBDFAM-RS. Membro do Conselho Consultivo do IBRADIM. Possui certificação internacional EXIN - Data Protection and Privacy e Security Information System. Coordenadora de livros e autora de artigos jurídicos.