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06 de Novembro de 2010

Artigo - Uma nova finalidade para a Procuração Pública - Por Daniel Francisco Nagão Menezes

Muita celeuma foi criada com a Medida Provisória 507 de 06 de outubro de 2010 e sua posterior regulamentação pela Receita Federal do Brasil, por meio da Portaria 1.860 de 11 de outubro de 2010. Em linhas gerais, tanto a MP quanto a Portaria exigem Procuração por Instrumento Público para a prática de atos perante a Secretaria da Receita Federal que impliquem fornecimento de informações protegidas por sigilo fiscal.

A Medida Provisória foi criada no meio da campanha eleitoral para a Presidência da República. Durante referida campanha presidencial, a partir de um computador da Receita Federal foi supostamente quebrado o sigilo fiscal da filha do candidato José Serra. Como resposta a exploração política do episódio da quebra do sigilo fiscal, o Governo Federal editou a MP que regula o acesso a informação por terceiro na Receita Federal.

Em síntese, a Medida Provisória, com intuito de garantir maior proteção ao sigilo fiscal e informações que transitam no órgão fazendário, passou a exigir, nos termos do seu art. 5º, procuração por instrumento público específico, lavrada por tabelião (No Estado de São Paulo, também o Registrador Civil), conforme a lei 8.935/94.

Como reação à MP, diversos órgão, em especial o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), teceram duras críticas contra a MP 507/10 acusando-a de dificultar o trabalho dos advogados e do cidadão perante a Receita Federal.

Do ponto de vista jurídico, a MP é válida, vez que, nos termos do art. 62 da Constituição Federal, possui força de lei, tendo cumprimento imediato. Também não há qualquer incompatibilidade com o Código Civil ou Estatuto da Advocacia, pois a MP 507 é lei mais específica, isto é, somente se aplica às procuração para uso na Receita Federal, não dizendo respeito às Procurações em geral.

Em parte, as críticas da OAB são pertinentes, mas por outro lado não propõe o real debate sobre o uso indiscriminado das procurações particulares que vem ocorrendo.

É insofismável que a exigência de procuração pública ao cidadão comum, que raras vezes na vida possui algum pequeno problema com a Receita, constitui um dificultador. Este cidadão, em especial, normalmente recorre a um contador ou advogado para solver seu problema, normalmente uma declaração equivocada de imposto de renda, ou ainda, atraso no pagamento de tributo de sua pequena empresa.

A imposição de escritura pública dificulta o acesso do cidadão comum aos serviços da Receita Federal, pois além dos procedimentos normais, tal exigência implicará a ida do cidadão a um Cartório de Notas e o pagamento das custas, que não são baratas para a grande parte da população. Tal exigência pode implicar o afastamento do cidadão comum da Receita Federal, todavia, certamente garantirá a ele segurança nesta relação, vez que terá efetivo conhecimento de quais poderes esta outorgando ao profissional contratado e qual a extensão destes.

Para as empresa, objeto principal da preocupação da OAB, as críticas são impertinentes, pois a MP não exige Procuração Pública em caso de uso de Certificado Digital, nos termo do art. 5º, §2º, II da MP 507/10, sendo certo que todas as empresas desde 2010 são obrigadas a utilizar tal documento digital. Logo, os grandes demandantes da Receita Federal estão excluídos da exigência de instrumento público pela MP 507.

Feitas estas considerações, o ponto principal da questão, que a OAB não traz em suas críticas, é o abuso na utilização de procurações que os advogados vêm realizando, com fulcro no art. 654 do Código Civil que permite que qualquer pessoa capaz outorgue procuração particular.

Qualquer advogado militante observa diariamente o uso de procurações equivocamente preenchidas, sem datas, sem poderes claramente delimitados, muitas vezes "baixadas" da internet.

Mais grave, e que acontece com extrema freqüência, é o fato do constituído não expor ao constituinte quais poderes este está outorgando no documento particular e o que estes implicam. Na maioria das vezes, o cidadão que está outorgando a procuração não tem conhecimento de qual a finalidade daquele documento e o que o advogado ou contador pode fazer com tal documento.

No caso da procuração pública isso não pode acontecer, o notário é obrigado por lei a informar o constituinte de quais os poderes que está outorgando, de qual é a extensão de cada um, até mesmo, porque sua atividade é indagar ao constituinte quais poderes vai outorgar e para quem, não incluindo na procuração qualquer poder que não seja a livre vontade do outorgante.

Caso tais informações não sejam oferecidas pelo notário, este responde civilmente por eventuais danos sofridos pelo constituinte em caso de mau uso da procuração, além de responder administrativamente por descumprimento de deveres de sua atividade.

Por este motivo, a ampliação do uso da procuração pública e a maior segurança para os negócios que esta traz, deveria ser o mote da discussão da OAB. Ou seja, como ampliar e facilitar o uso da Procuração Pública, diminuindo seu custo e facilitando seu acesso nos Cartórios de Notas e de Registro Civil.

A sugestão é o início de um debate público sobre o uso indevido das procurações particulares e as formas de se popularizar o uso da procuração pública, com o maior acesso do cidadão aos cartórios.

Autor: Daniel Francisco Nagão Menezes é Mestre em Direito Político e Econômico pelo Mackenzie, professor do Centro Universitário Padre Anchieta e da Anhanguera/LFG, Advogado em Campinas/SP