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16 de Outubro de 2008

Artigo - Filhos de brasileiros nascidos no exterior - Por Fátima Cristina Ranaldo Caldeira

*Fátima Cristina Ranaldo Caldeira

Dos atos de competência do Registro Civil das Pessoas Naturais, um dos mais complexos pelas suas peculiaridades é o traslado, também chamado transcrição das certidões de nascimento dos nascidos em país estrangeiro, cujos pais ou um deles seja brasileiro, uma vez que a certidão deles extraída servirá como prova da nacionalidade provisória ou definitiva, conforme o caso.

O Brasil trata da nacionalidade no seu texto constitucional, cujas formas de aquisição são duas: originária ou primária que é a decorrente do nascimento e secundária, derivada ou adquirida que é a obtida no decorrer da vida, por ato de vontade (naturalização).

Quanto à nacionalidade originária, basicamente todos os países do mundo adotam um dos seguintes critérios para definir quem são os seus nacionais: o jus soli e o jus sanguinis. Pelo primeiro, a pessoa tem a nacionalidade do país em que nasceu e, pelo segundo, tem a mesma nacionalidade de seus descendentes, independente do país do nascimento.

O Brasil adota predominantemente o jus soli mas também leva em conta o jus sanguinis, chegando Celso de Mello a dizer que de tantas exceções em favor do jus sanguinis adotamos um sistema misto.

Os titulares da nacionalidade brasileira, chamados brasileiros natos são definidos nas alíneas "a", "b" e "c", inciso I, artigo 12 da nossa Constituição.

A alínea "a" estabelece que são brasileiros natos os nascidos na República Federativa do Brasil, mesmo que filhos de estrangeiros que não estejam a serviço do seu país. Trata-se da aplicação do jus soli, dependendo a nacionalidade tão somente do país em que o nascimento ocorreu. A exceção ocorrerá se os pais estrangeiros estiverem a serviço de seu país.

A segunda hipótese é a da alínea "b" que define como brasileiros natos os nascidos no estrangeiro, filhos de pai ou mãe brasileira, se qualquer deles estiver a serviço do país. Neste caso, o critério adotado é o jus sanguinis acrescido do fato de um dos pais estar a serviço do Brasil. Assim, filho nascido no exterior, cujo pai ou a mãe brasileira esteja no exterior servindo um órgão público do Brasil é brasileiro nato.

A última hipótese é da alínea "c", cuja redação foi dada pela Emenda Constitucional nº54 de 20/09/2007 e trata dos nascidos no exterior, cujos pais ou um deles seja brasileiro e não esteja a serviço do Brasil. Estes, se forem registrados em repartição brasileira do local do nascimento (Embaixada ou Consulado) são brasileiros natos e se forem registrados em repartição estrangeira, dependem, para serem brasileiros, de duas condições: virem a residir no Brasil e optarem, a qualquer tempo depois de completada a maioridade civil pela nacionalidade brasileira. Esta é uma forma de aquisição de nacionalidade chamada de potestativa por depender de ato de vontade para a sua confirmação.

Assim, vale dizer que a prova da nacionalidade dos que a adquiriram pelo critério do jus soli é feita pela certidão extraída do assento de nascimento lavrado no Registro Civil competente. (grifo nosso).

Já quando a aquisição for pelo critério do jus sanguis e a certidão de nascimento tiver de produzir efeito no Brasil, é preciso que ela seja trasladada no 1º Ofício do domicílio do registrado ou no 1º Ofício do Distrito Federal, na falta de domicílio conhecido, conforme dispõe o parágrafo 1º, artigo 32, Lei 6.015/73, independente de ter sido lavrada por repartição brasileira ou estrangeira.

É certo que do traslado das certidões dos filhos nascidos no estrangeiro de pai ou mãe brasileira que estejam a serviço do Brasil e daqueles que foram registrados em repartição brasileira no local de nascimento, não constará quaisquer circunstâncias quanto à necessidade de opção, já que são brasileiros natos. Também é certo que dos traslados das certidões lavradas a partir da Emenda Constitucional nº03/94, expedidas pelas repartições brasileiras constava a necessidade da opção. Essa situação foi alterada a partir de 20/09/2007 pela Emenda Constitucional nº 54, que garantiu a condição de brasileiro nato aos registrados em repartição brasileira. Assim, as pessoas que nasceram em países estrangeiros, filhas de pai ou mãe brasileira e que foram registrados em repartição brasileira no exterior e de cujo traslado feito no Brasil conste a necessidade da opção, devem requerer, pessoalmente ou através de seus pais, se menores, ao Cartório que lavrou o traslado para que sejam adotadas as providências no sentido de tornar sem efeito a menção à necessidade de opção e passar a constar que são brasileiros natos. No quadro, relação dos brasileiros natos e dos critérios e forma de provar a nacionalidade provisória e definitiva:

1. Nascidos no Brasil, independente da nacionalidade dos pais e, no caso de pais estrangeiros que não estejam a serviço de seus países. / jus solis / A prova da nacionalidade é a certidão de nascimento expedida pelo Cartório do Registro Civil das Pessoas Naturais em que foi feito o registro.

2. Nascidos no exterior, filho de brasileiro (a) que esteja no país do nascimento a serviço do Brasil. / jus sanguinis / A prova da nacionalidade, quando tiver de produzir efeitos no Brasil, é a certidão extraída do traslado da certidão de nascimento feita pelo Cartório do 1º Subdistrito do domicílio do interessado.

3. Nascidos no exterior, filho de brasileiro (a) desde que registrado em repartição brasileiro no país de nascimento. / jus sanguinis / A prova da nacionalidade, quando tiver de produzir efeitos no Brasil, é a certidão extraída do traslado da certidão de nascimento feita pelo Cartório do 1º Subdistrito do domicílio do interessado.

4. Nascidos no exterior, filho de brasileiro (a) registrado em repartição estrangeira. / jus sanguinis / A prova da nacionalidade, quando tiver de produzir efeitos no Brasil, é a certidão extraída do traslado da certidão de nascimento feita pelo Cartório do 1º Subdistrito do domicílio do interessado até a maioridade (provisória) e a certidão extraída do registro da opção de nacionalidade feita pelo Cartório do 1º Subdistrito do domicílio do interessado após completada a maioridade (nacionalidade brasileira definitiva).

Prevalece a necessidade de vir a residir no Brasil e optar pela nacionalidade brasileira aos filhos de brasileiro ou brasileira nascidos no exterior que foram registrados em repartição estrangeira (órgão equivalente ao Registro Civil das Pessoas Naturais , conforme a legislação do país). A homologação da opção é requerida ao juiz federal de domicílio do interessado e, posteriormente, registrada no 1º Ofício do Registro Civil do domicílio do interessado para cumprimento do inciso VII, artigo 29, Lei 6015/73. Do ponto de vista registral, a ausência do traslado da certidão de nascimento do optante não obsta o registro da opção. No entanto, se a mesma estiver transcrita na mesma Unidade de Registro Civil, a opção será anotada à sua margem e, se o Oficial tiver conhecimento de que a transcrição foi efetuada em outra Unidade procederá a comunicação para a devida anotação (Lei 6.015/73, artigo 106 e seguintes).

No quadro abaixo, as condições estabelecidas para a obtenção da condição de brasileiro nato aos filhos nascidos no estrangeiro, de brasileiro ou brasileira desde a época do Império, quando foi promulgada a nossa primeira Constituição( deixamos de mencionar o período de vigência da EC nº03 afim de salientar as alterações decorrentes da EC nº54).



Promulgação da Constituição / Período de vigência / Condições

23/03/1824 / 23/03/1824 até 23/02/1891 / Filho de pai brasileiro ou ilegítimo(fora do casamento) de mãe brasileira e estabelecer domicílio no Império

24/02/1891 / 24/02/1891 até 15/07/1934 / Filho de pai brasileiro ou ilegítimo de mãe brasileira e estabelecer domicílio na República

16/04/1934 / 16/07/1934 até 09/11/1937 / Filho de pai ou mãe brasileira e optar pela nacionalidade após a maioridade

10/11/1937 / 10/11/1937 até 17/09/1946 / Filho de pai ou mãe brasileira e optar pela nacionalidade após a maioridade

18/09/1946 / 18/09/1946 até 23/01/1967 / Filho de pai ou mãe brasileira; vier a residir no Brasil; optar pela nacionalidade dentro de 4 anos após a maioridade

24/01/1967 / 24/01/1967 até 04/10/1988 / Filho de pai ou mãe brasileira e registrado em repartição brasileira é brasileiro nato e se registrado em repartição estrangeira, vir a residir no Brasil antes da maioridade e optar no prazo de 4 anos após maioridade

05/10/1988 (EC nº54) / a partir de 05/10/1988 / Filho de pai ou mãe brasileira e registrado em repartição brasileira é brasileiro nato e se registrado em repartição estrangeira se vir a residir no Brasil e optar a qualquer tempo pela nacionalidade brasileira.

Encerramos lembrando que a Declaração Universal dos Direitos dos Homens proclama no artigo XV que: "todo homem tem direito a uma nacionalidade" e complementa o princípio no parágrafo seguinte: "Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade".

*Fátima Cristina Ranaldo Caldeira é Oficiala do Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Sede da Comarca de Americana- Estado de São Paulo.
Este texto, publicado anteriormente, teve a sua redação alterada em virtude da Emenda Constitucional nº 54 de 20/09/2007.

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