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01 de Outubro de 2010

Jurisprudência TJ-SP - Tutela do nome - Os pais do filho morto podem exigir que se cumpra ato inter vivos envolvendo exclusão do nome de família da ex-mulher

Tutela do nome - Os pais do filho morto podem exigir que se cumpra ato inter vivos envolvendo exclusão do nome de família da ex-mulher, conforme acordo na separação judicial e que não foi homologado devido ao óbito - A ex-mulher [viúva] que manifesta propósito coincidente deverá obter, para alterar seus documentos pessoais, obter retificação do registro, averbando que voltou a usar o nome de solteira - Circunstância especial que autoriza o Tribunal, na forma do art. 109, § 1°, da Lei 6015/73, a retificar o nome e excluir o patronímico, determinando que a apelante providencie a retificação de documentos em trinta dias, sob pena de multa diária - Provimento, em parte.

EMENTA

Tutela do nome - Os pais do filho morto podem exigir que se cumpra ato inter vivos envolvendo exclusão do nome de família da ex-mulher, conforme acordo na separação judicial e que não foi homologado devido ao óbito - A ex-mulher [viúva] que manifesta propósito coincidente deverá obter, para alterar seus documentos pessoais, obter retificação do registro, averbando que voltou a usar o nome de solteira - Circunstância especial que autoriza o Tribunal, na forma do art. 109, § 1°, da Lei 6015/73, a retificar o nome e excluir o patronímico, determinando que a apelante providencie a retificação de documentos em trinta dias, sob pena de multa diária - Provimento, em parte. (TJSP - Apelação Cível nº 601.915.4/2 - São Paulo - 4ª Câmara de Direito Privado - Rel. Des. Enio Zuliani - Julgado em 14.05.2009)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO N° 601.915.4/2, da Comarca de SÃO PAULO, sendo apelante RENATA MARGARIDA DO VAL GONÇALVES e apelados LUIZ CARLOS BUGELLI e outra.

ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Privado, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, dar provimento, em parte, ao recurso.

RELATÓRIO E VOTO

Vistos.

RENATA MARGARIDA DO VAL recorre da r. sentença que, ao acolher ação promovida por LUIZ CARLOS BUGELLI e BENEDICTA MAGDA DOS ANJOS BUGELLI, impôs obrigação relacionada com o cumprimento de acordo homologado na separação que fez com o finado filho dos autores [excluir do nome o patronímico Bugelli], reafirmando a questão de ilegitimidade ativa dos pais do ex-marido para esse tipo de provocação e o não cabimento de multas cominatórias até porque a averbação, no assento de casamento, de que voltaria a usar o nome de solteira, não ocorreu devido a falta de empenho do finado, que se obrigou a cumprir o acordo homologado.

Decide-se.

Os autores defendem, de forma direta, iure proprium [art. 16, do CC] e, de forma indireta, a memória do filho morto [art. 20, § único, do CC], na medida em que ele, em vida, atuou de forma a fazer com que sua exesposa [a ora apelante] se abstivesse do uso do patronímico "Bugelli", conforme consta do acordo de separação [fl. 25]. A tutela do sobrenome não está condicionada ao cumprimento de qualquer sentença, o que torna irrelevante, pelo menos para efeito de interpretar a legitimidade ativa [arts. 3º e 267, VI, do CPC] o assunto relacionado com a não homologação do acordo.

Parece evidenciada a não homologação da separação consensual. Os autores não fizeram prova desse fato e pelo teor da cópia da r. sentença de fls. 136 e 141, não consta ter ocorrido a homologação e conseqüente sentença de separação na forma consensual. Ao que tudo indica e porque os autores não demonstram os fatos que alegam [art. 333, I, do CPC] é de se considerar a requerida como viúva e não como separada. Portanto, a r. sentença deveria ter considerado esse estado civil e não o de mulher separada portando certidão para ser averbada. Não há documento que prove ter sido homologada a separação.

De qualquer modo e considerando o teor do acordo que deveria ser homologado, deve a apelante providenciar a retificação do seu registro para que seu nome volte a ser o de solteira [RENATA MARGARIDA DO VAL GONÇALVES], o que, aliás, foi providenciado [fl. 68]. Porém, segundo informações obtidas no Cartório da 6ª Vara Cível de Santo Amaro, o pedido que a autora fez nesse sentido, foi rejeitado e a sentença passou em julgado.

Esse contexto modifica o panorama e impede que se declare o inadimpiemento da apelante, no que diz respeito ao cumprimento de cláusula da separação. Como não existe prova da homologação da separação e da expedição do mandado de averbação [provas essas que os autores deveriam produzir] não existe vínculo que estabeleça termo final caracterizador do estado de mora debitoris. O máximo que se poderia cogitar é a emissão de uma sentença que obrigasse a apelante a providenciar alteração do registro de casamento e nascimento, para que, como viúva, voltasse a usar o nome de solteira, coisa que a autora providenciou de forma espontânea e não obteve resposta positiva.

Essa iniciativa da autora constitui outro ponto que redimensiona a avaliação jurídica, porque se a própria interessada está se movimentando para obter o retorno ao status quo ante, fica evidente que não há dissenso entre as partes da pertinência, oportunidade e juridicidade de a exesposa [ou corretamente viúva], de retirar o patronímico "Bugelli". Portanto, a retirada do sobrenome do finado Júlio César atende aos interesses das partes, porquanto o propósito da mulher de excluir o "Bugelli" do seu nome vai de encontro ao desejo dos pais, o que dispensa exame das razões desse desiderato. Não há necessidade de justificação dos motivos que conduziram os autores a pleitearem a exclusão, o que é vantajoso para evitar que o Judiciário examine, sem utilidade, o teor das acusações sobre conduta desonrosa da apelante e que está relacionada com a emissão de cheques sem provisão de fundos e outras pendências que foram listadas pelos autores. Se a intenção é comum, basta oficializar para que isso ocorra realmente.

Como a apelante já ingressou com ação para modificar o seu nome [excluir o "Bugelli"] não caberia aplicar a multa, como se estivesse em mora culposa. A apelante não poderia ser penalizada por não ter providenciado a retificação de documentos, porque não se pode afirmar que existe uma sentença de separação a ser averbada e isso é impeditivo de medidas para retificação de documentos pessoais. O ponto de partida para o refazer dos documentos é o cumprimento da sentença que deferir a retificação do nome da apelante e não há como considerá-la inadimplente quanto a isso, porque não existe ordem para que fosse ajuizada essa ação, sendo que não lhe cabe impor sanções quando se sabe que o resultado desse pedido é imprevisível, tanto que não obteve êxito. A multa é descabida e somente seria exigível caso se confirmasse a recusa da apelante em cumprir sentença que modificou o seu nome, o que ainda não existe na ordem jurídica.

De qualquer maneira, não há como perpetuar a indefinição, porquanto o acordo assinado pelas partes é um título que concede aos autores direito de exigir que a apelante se abstenha do uso do sobrenome "Bugelli" e o Tribunal, utilizando o art. 109, § 1o, da Lei 6015/73, delibera retificar os assentos de nascimento e casamento, para que conste que a apelante volta a usar o nome de solteira, RENATA MARGARIDA DO VAL GONÇALVES, expedindo-se mandado para averbação no Cartório do 14a Subdistrito da Lapa [termo 20230, livro B-0068, fl. 188] e para averbação na certidão de nascimento, em São José do Rio Preto [fl. 144]. Anote-se que a licença para decidir decorre do art. 1109, do CPC e do fato de que se não for construída uma decisão sobre a retificação do, não se resolve o impasse familiar e isso depõe contra a credibilidade do Judiciário. Não há litigiosidade sobre a necessidade de voltar a mulher a usar o nome de solteira, ainda que viúva.

Considerando, pois, o efeito dessa decisão, deverá a apelante providenciar as averbações necessárias [nada impedindo que os autores o façam], porque a partir do trigésimo dia da emissão dos mandados incidirá multa diária pelo não cumprimento do dever de retificar os documentos mencionados pela r. sentença.

Isso posto, dá-se provimento em parte para, na forma do art. 109, § 1º, da Lei 6015/73, deferir a retificação do registro de nascimento e de casamento da apelante, para que conste que voltou a usar o nome de solteira [RENATA MARGARIDA DO VAL GONÇALVES] expedindo-se os respectivos mandados para as averbações, devendo a apelante, em trinta dias após a emissão desses mandados, providenciar a retificação de seus documentos pessoais, excluindo em todos eles o patronímico "Bugelli", sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 a partir do trigésimo primeiro dia e até que se acumule o valor de R$ 50.000,00.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores MAIA DA CUNHA e FÁBIO QUADROS.

São Paulo, 14 de maio de 2009.

ÊNIO SANTARELLI ZULIANI - Presidente e Relator.

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