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25 de Novembro de 2010
Jurisprudência TJ-RS - Apelação cível - Responsabilidade civil - DETRAN - Tabelião de notas - Erro de funcionário do tabelionato
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DETRAN. TABELIÃO DE NOTAS. ERRO DE FUNCIONÁRIO DO TABELIONATO. MULTA EQUIVOCADAMENTE IMPOSTA. DETRAN. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. O DETRAN não sofreu condenação nenhuma, nem no mérito nem no que diz com a distribuição dos ônus da sucumbência, não possuindo, assim, interesse recursal. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE PASSIVA. TABELIÃO. Preliminar examinada com o mérito, pois os argumentos que a fundamentam com ele se confundem. MÉRITO. RESPONSABILIDADE CIVIL. TABELIÃO. Da combinação dos arts. 37, § 6° e 236 da CF com o art. 22 da Lei n° 8.935/95 extrai-se a responsabilidade objetiva dos tabeliães pelos atos próprios de serventia praticados por si ou seus prepostos. No caso, se toda a cadeia de fatos que culminou na imposição equivocada de penalidade ao autor decorreu de erro de funcionário do Tabelionato, evidente está a responsabilidade do tabelião pela reparação dos danos perpetrados àquele. NÃO CONHECERAM DO APELO DO DETRAN E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DE FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS. UNÂNIME. (TJRS - Apelação Cível nº 70032035784 - Passos Fundo - 9ª Câm. Cível - Rel. Des. Iris Helena Medeiros Nogueira - DJ 22.03.2010).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em não conhecer do apelo do DETRAN e negar provimento ao apelo de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores DES.ª MARILENE BONZANINI BERNARDI E DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY.
Porto Alegre, 10 de março de 2010.
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA - Presidente e Relatora.
RELATÓRIO
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (PRESIDENTE E RELATORA)
Cuida-se de apelos interpostos por DETRAN - DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS nos autos da ação de indenização cumulada com ação de obrigação de fazer que lhes moveu EDER ADILSON ROTT, contra a sentença (fls. 122-127) em que julgado procedente em parte o pedido, conforme o seguinte dispositivo:
"EM RAZÃO DO EXPOSTO, afastadas as prefaciais arguidas nas contestações, julgo parcialmente procedente o pedido deduzido por EDER ADILSON ROTT em face do DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI, para o efeito de condenar este segundo réu ao pagamento de R$ 127,69, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, da FGV, desde 16 de abril de 2007, e com a incidência de juros moratórios de 1% ao mês desde 20 de abril de 2007.
Considerando a reciprocidade na sucumbência (artigo 21, caput, do Código de Processo Civil), condeno o demandante ao pagamento de 75% das despesas processuais, bem como de honorários advocatícios em favor do réu Departamento Estadual de Trânsito e do procurador do réu Francisco Antônio Nicolini, os quais vão fixados em R$ 600,00 (seiscentos reais) para cada um, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, da FGV, desde a data da prolação desta sentença, forte o artigo 20, §4º, do Código de Processo Civil, observados os ditames das alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo anterior. Outrossim, condeno o réu Francisco Antônio Nicolini ao pagamento de 25% das despesas processuais, bem como de honorários advocatícios em favor da advogada do demandante, os quais vão fixados em R$ 600,00 (seiscentos reais), corrigidos monetariamente pelo IGP-M, da FGV, desde a data da prolação desta sentença, forte o artigo 20, §4º, do Código de Processo Civil, observados os ditames das alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo anterior. Possível a compensação dos honorários, na forma do enunciado nº 306 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
Suspendo, entretanto, a exigibilidade dos ônus da sucumbência em relação ao autor, por litigar sob o pálio da justiça gratuita (artigo 12 da Lei nº 1.060/50).´
O DETRAN, em suas razões de apelação (fls. 130-133), reeditou preliminar de ilegitimidade passiva, uma vez que o ato questionado não é seu mas sim de funcionário do Tabelionato de Colorado, que, por caligrafia ilegível, digitou incorretamente a data de aquisição do veículo. Citou o Regulamento dos CRVAs - Centros de Registros de Veículos Automotores, destacando serem estes os responsáveis pelo lançamento de dados no sistema informatizado do DETRAN. Destacou que o CRVA é pessoa jurídica de direito privado com personalidade jurídica própria, respondendo, assim, por seus atos. Argumentou acerca da perda do objeto da demanda, pois já anulou e retirou dos registros a infração. Pediu o acolhimento da preliminar ou, no mérito, a reforma da sentença.
O requerido FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI, tabelião, em sede recursal (fls. 134-142), suscitou preliminar de ilegitimidade passiva, uma vez que, sendo a responsabilidade dos notários e registradores subjetiva e indireta, o legitimado para figurar no pólo passivo é o Estado. Observou que a responsabilidade dos notários e registradores é regressiva, e somente nos casos de dolo ou culpa.
No mérito, admitiu o erro administrativo do CRVA ao dar início ao processo de transferência do veículo, lançando no sistema data de aquisição equivocada. Não teve o tabelião, no entanto, qualquer participação em tal conduta, uma vez que no Certificado de Registro de Veículo Automotor a data está correta. Ademais, a interpretação incorreta de sua caligrafia pelo funcionário do CRVA não é conduta que pode ser-lhe imputada. Citou as Leis n° 6.015/73, 8.935/94 e 9.492/97, asseverando acerca da ausência dos pressupostos ensejadores da responsabilidade civil.
O autor (fls. 150-155 e fls. 156-161) e o DETRAN (fls. 162-166) apresentaram contrarrazões.
Subiram os autos a este Tribunal e, com o parecer do Ministério Público (fls. 176-178), vieram à minha conclusão, para julgamento, em 18.01.2010 (fl. 179).
É o relatório.
VOTOS
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (PRESIDENTE E RELATORA)
DO CASO:
Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com ação de indenização promovida em desfavor do DETRAN - DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI, Tabelião de Notas. Por "caligrafia ilegível do funcionário do Tabelionato de Colorado/RS" (certidão de fl. 24) houve erro no registro da data de aquisição do veículo do autor, fazendo parecer que o bem tinha sido adquirido há mais de trinta dias sem registro. Com isso, o DETRAN lhe impôs penalidade (fl. 17).
Nesse contexto, o autor propôs a presente ação objetivando: a) o cancelamento da multa e da pontuação em sua CNH - Carteira Nacional de Habilitação (situação que foi regularizada durante o trâmite do processo, destaco); b) a devolução do valor da multa (R$ 127,69); e c) indenização por dano material e moral.
A sentença, de procedência parcial, rejeitou os pedidos de indenização, determinando apenas ao tabelião FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI que indenizasse o demandante do valor despendido com o pagamento da multa.
DO NÃO CONHECIMENTO APELO DO DETRAN / FALTA DE INTERESSE RECURSAL:
O DETRAN não sofreu condenação nenhuma, nem no mérito nem no que diz com a distribuição dos ônus da sucumbência, não possuindo, desse modo, interesse recursal. Observe-se que trouxe à baila, em seu recurso, questões preliminares e tangenciou o mérito da causa, nada referindo sobre os honorários de seu patrono - ponto em que se poderia cogitar interesse recursal -.
Não é de ser conhecido, desse modo, seu apelo.
DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO TABELIÃO:
Os argumentos trazidos à baila por tal réu para fundamentar a preliminar de ilegitimidade passiva - espécie de responsabilidade civil, se objetiva ou subjetiva - dizem, a toda a evidência, com o mérito da causa, e serão, portanto, com ele examinados.
DO MÉRITO:
Da combinação dos artigos 37, § 6° e 236 da Constituição Federal com o artigo 22 da Lei n° 8.935/95 extrai-se a responsabilidade objetiva dos tabeliães pelos atos próprios de serventia praticados por si ou seus prepostos. Nestes termos trago à baila o parecer ministerial de fls. 170-173, firmado pela DD. Procuradora de Justiça Dra. Tânia Maria Vieira Lorenzoni, que demonstra - até pelos arestos de jurisprudência colacionados - o entendimento desta Nona Câmara Cível sobre o tema. Vejamos então:
"Do apelo do Tabelião - Francisco Antônio Nicolini:
A responsabilidade dos tabeliães é objetiva, nos termos do disposto nos artigos 37, § 6° e 236 da Constituição Federal, bem como 22 da da Lei 8.935/94, não permanecendo qualquer dúvida quanto à responsabilização dos notários.
Transcreve-se:
Art. 37.
§ 6° - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos:
Na mesma esteira os seguintes arestos:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TABELIÃO. INOBSERVÂNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. CIÊNCIA DE CONTRATANTES A RESPEITO DA EXISTÊNCIA DE DEMANDA JUDICIAL SOBRE IMÓVEL OBJETO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE OS DANOS E A CONDUTA (OMISSÃO) DO RÉU. Prestando o tabelião serviço público por delegação do estado, sua responsabilidade é objetiva nos termos do art. 37, § 6º e 236 da CF. Precedentes jurisprudenciais. Na casuística, os danos apontados pelo autor referente a perda do bem imóvel que adquiriu não guardam relação causal com a atuação do notário, pois o prejuízo decorreu da conduta da vendedora que alienou o bem em duplicidade, sendo apenas o segundo registrado no álbum imobiliário. A falta de atendimento à liminar deferida para ciência da parte adquirente do negócio anterior com o autor, não é suficiente para identificar responsabilidade civil do tabelião, pois a ordem judicial se restringia a mera notificação, não impedindo a realização do negócio, conduta que foi ratificada pelo adquirente por ocasião da retificação da escritura pública. Ausente o nexo causal, não há dever de indenizar. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70026850545, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 05/08/2009)
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO DO REGISTRO DE PROTESTO DE NOTAS PROMISSÓRIAS JÁ PRESCRITAS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO NOTÁRIO. ÔNUS DO CANCELAMENTO QUE RECAI SOBRE O DEVEDOR MEDIANTE APRESENTAÇÃO DE DECLARAÇÃO DE ANUÊNCIA EMITIDA PELO CREDOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 2º DA LEI Nº. 6.690/79 E PELO ART. 26 DA LEI Nº. 9.492/97. 1. RESPONSABILIDADE CARTORÁRIA. A jurisprudência do STF é pacífica no sentido de que, em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do artigo 236 da Constituição Federal, a responsabilidade é objetiva, tanto do Estado como do serventuário titular de cartório e registro extrajudicial. 2. ÔNUS DO CANCELAMENTO. Presente a necessidade de diferenciar duas situações no caso de permanência indevida do protesto junto ao Cartório: (a) aquela em que o aponte é oriundo de relação jurídica de direito material regida pelo Código de Defesa do Consumidor; (b) aquela em que o protesto fora lavrado em decorrência de dívida cuja origem desborda dos limites de uma relação consumerista. No primeiro caso, cabe ao credor a realização de todas as diligências necessárias para o cancelamento do protesto, após o pagamento do débito, ex vi dos artigos 43, § 3º, e 73, do CDC. No segundo, a obrigação do cancelamento do protesto após o pagamento efetuado extemporaneamente é ônus do devedor, conforme dispõe o art. 26 da Lei nº. 9.492/97 e o art. 2º da Lei nº. 6.690/79, que atribui a qualquer interessado, inclusive ao devedor, o ônus de requerer o cancelamento. 2. No caso em apreço, não se trata de relação consumerista, motivo pelo qual incumbia ao devedor, ou a qualquer interessado, solicitar o cancelamento do protesto. 3. Ora, não houve inobservância pelo tabelião dos preceitos legais (Lei nº. 9.492/97), nem ao efetivar o protesto (porquanto à época dos fatos as notas promissórias não estava prescritas), nem ao manter o registro (levando em conta a ausência de conduta culposa por ser ônus do devedor o levantamento do registro após o pagamento da dívida). APELAÇÃO PROVIDA. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70026226266, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 18/02/2009)
Em sendo objetiva a responsabilidade do tabelião, as circunstâncias fáticas que levaram ao equívoco na anotação registral junto ao DETRAN em nada alteram o ônus que recai sob o apelante, já que a Lei 8.935/94 é expressa ao determinar os Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos."
Nesse mesmo sentido a sentença, que vai mantida por seus próprios fundamentos, in verbis:
"(...) o dispositivo consagra a responsabilidade objetiva do Estado - independentemente de comprovação de culpa - pelos danos causados por seus agentes a terceiros por ato comissivo.
Aliás, a jurisprudência vem aplicando esse dispositivo inclusive para a responsabilidade civil do tabelião, como verte dos seguintes julgados, assim ementados, este do Supremo Tribunal Federal, aquele do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
"RESPONSABILIDADE OBJETIVA - ESTADO - RECONHECIMENTO DE FIRMA - CARTÓRIO OFICIALIZADO. Responde o Estado pelos danos causados em razão de reconhecimento de firma considerada assinatura falsa. Em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do artigo 236 da Constituição Federal, a responsabilidade objetiva é do notário, no que assume posição semelhante à das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos - § 6º do artigo 37 também da Carta da República." (RE 201595, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Segunda Turma, julgado em 28/11/2000, DJ 20-04-2001 PP-00138 EMENT VOL-02027-09 PP-01896) - grifo da subscritora.
"RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTRUMENTO DE PROTESTO LAVRADO POR TABELIÃO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO. ENDEREÇO ERRÔNEO. ALEGAÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL POR PARTE DO NOTÁRIO. AUSÊNCIA DE FALHA NO SERVIÇO. Pacificada no STF a tese de que, em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do artigo 236 da Constituição Federal, a responsabilidade é objetiva, tanto do Estado como do serventuário titular de cartório e registro extrajudicial. No caso sub judice, no entanto, não restou caracterizada a prática de ato ilícito ou falha no serviço da Tabeliã, que agiu dentro dos limites preconizados pela Lei nº 9492/97. Dever de indenizar não reconhecido. Sentença mantida. APELO IMPROVIDO." (Apelação Cível Nº 70012531737, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Antônio Kretzmann, Julgado em 26/01/2006).
Em suma, a responsabilidade civil do Estado e de seus agentes é objetiva, isto é, independe de comprovação de dolo ou culpa. Sendo assim, a responsabilidade civil subjetiva do Estado exige comprovação de: (a) conduta; (b) dano; e (c) nexo de causalidade.
Quanto à conduta, o artigo 22 da Lei 8.935/94 reza que:
"Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos."
Dessa forma, mera análise visual na data de transferência veiculada no documento da fl. 13 basta para concluir-se por sua ilegibilidade, fato que, aliás, nem foi controvertido nos autos e desencadeou os demais acontecimentos descritos na exordial.
Não se olvida que o cotejo entre as datas de transferência e de reconhecimento de firma pudesse alterar o entendimento do agente de trânsito, porém o fato é que a grafia do algarismo exarado pelo tabelião demandado parece-se com um "1" e não com um "8", como seria o correto, o que foi ratificado pelo teor do documento da fl. 24.
E exigir ampla análise acerca do contexto que envolve uma informação que goza de fé pública soa como medida desproporcional aos propósitos de uma corriqueira fiscalização de trânsito. Logo, evidente que a conduta que originou os fatos em questão foi do tabelião demandado ou de seus prepostos, não havendo que se falar em fato praticado por servidor da autarquia.
Na verdade, em relação a essa ré, sem embargo existentes alegações de ato ilícito e de danos, as assertivas anteriores indicam a inexistência de nexo de causalidade que impede a responsabilização civil.
Ora, se toda a cadeia de fatos que culminou na imposição equivocada de penalidade ao autor (fl. 17) decorreu da "caligrafia ilegível do funcionário do Tabelionato de Colorado/RS", erro reconhecido na certidão de fl. 24, evidente está a responsabilidade do tabelião pela reparação dos danos perpetrados àquele.
DO DISPOSITIVO:
Por todo o exposto, não conheço do apelo do DETRAN e nego provimento ao apelo de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS.
É o voto.
DES.ª MARILENE BONZANINI BERNARDI (REVISORA) - De acordo com a Relatora.
DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY - De acordo com a Relatora.
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA - Presidente - Apelação Cível nº 70032035784, Comarca de Passo Fundo: "NÃO CONHECERAM DO APELO DO DETRAN E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DE FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: ALESSANDRA COUTO DE OLIVEIRA.
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DETRAN. TABELIÃO DE NOTAS. ERRO DE FUNCIONÁRIO DO TABELIONATO. MULTA EQUIVOCADAMENTE IMPOSTA. DETRAN. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. O DETRAN não sofreu condenação nenhuma, nem no mérito nem no que diz com a distribuição dos ônus da sucumbência, não possuindo, assim, interesse recursal. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE PASSIVA. TABELIÃO. Preliminar examinada com o mérito, pois os argumentos que a fundamentam com ele se confundem. MÉRITO. RESPONSABILIDADE CIVIL. TABELIÃO. Da combinação dos arts. 37, § 6° e 236 da CF com o art. 22 da Lei n° 8.935/95 extrai-se a responsabilidade objetiva dos tabeliães pelos atos próprios de serventia praticados por si ou seus prepostos. No caso, se toda a cadeia de fatos que culminou na imposição equivocada de penalidade ao autor decorreu de erro de funcionário do Tabelionato, evidente está a responsabilidade do tabelião pela reparação dos danos perpetrados àquele. NÃO CONHECERAM DO APELO DO DETRAN E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DE FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS. UNÂNIME. (TJRS - Apelação Cível nº 70032035784 - Passos Fundo - 9ª Câm. Cível - Rel. Des. Iris Helena Medeiros Nogueira - DJ 22.03.2010).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em não conhecer do apelo do DETRAN e negar provimento ao apelo de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores DES.ª MARILENE BONZANINI BERNARDI E DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY.
Porto Alegre, 10 de março de 2010.
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA - Presidente e Relatora.
RELATÓRIO
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (PRESIDENTE E RELATORA)
Cuida-se de apelos interpostos por DETRAN - DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS nos autos da ação de indenização cumulada com ação de obrigação de fazer que lhes moveu EDER ADILSON ROTT, contra a sentença (fls. 122-127) em que julgado procedente em parte o pedido, conforme o seguinte dispositivo:
"EM RAZÃO DO EXPOSTO, afastadas as prefaciais arguidas nas contestações, julgo parcialmente procedente o pedido deduzido por EDER ADILSON ROTT em face do DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI, para o efeito de condenar este segundo réu ao pagamento de R$ 127,69, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, da FGV, desde 16 de abril de 2007, e com a incidência de juros moratórios de 1% ao mês desde 20 de abril de 2007.
Considerando a reciprocidade na sucumbência (artigo 21, caput, do Código de Processo Civil), condeno o demandante ao pagamento de 75% das despesas processuais, bem como de honorários advocatícios em favor do réu Departamento Estadual de Trânsito e do procurador do réu Francisco Antônio Nicolini, os quais vão fixados em R$ 600,00 (seiscentos reais) para cada um, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, da FGV, desde a data da prolação desta sentença, forte o artigo 20, §4º, do Código de Processo Civil, observados os ditames das alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo anterior. Outrossim, condeno o réu Francisco Antônio Nicolini ao pagamento de 25% das despesas processuais, bem como de honorários advocatícios em favor da advogada do demandante, os quais vão fixados em R$ 600,00 (seiscentos reais), corrigidos monetariamente pelo IGP-M, da FGV, desde a data da prolação desta sentença, forte o artigo 20, §4º, do Código de Processo Civil, observados os ditames das alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo anterior. Possível a compensação dos honorários, na forma do enunciado nº 306 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
Suspendo, entretanto, a exigibilidade dos ônus da sucumbência em relação ao autor, por litigar sob o pálio da justiça gratuita (artigo 12 da Lei nº 1.060/50).´
O DETRAN, em suas razões de apelação (fls. 130-133), reeditou preliminar de ilegitimidade passiva, uma vez que o ato questionado não é seu mas sim de funcionário do Tabelionato de Colorado, que, por caligrafia ilegível, digitou incorretamente a data de aquisição do veículo. Citou o Regulamento dos CRVAs - Centros de Registros de Veículos Automotores, destacando serem estes os responsáveis pelo lançamento de dados no sistema informatizado do DETRAN. Destacou que o CRVA é pessoa jurídica de direito privado com personalidade jurídica própria, respondendo, assim, por seus atos. Argumentou acerca da perda do objeto da demanda, pois já anulou e retirou dos registros a infração. Pediu o acolhimento da preliminar ou, no mérito, a reforma da sentença.
O requerido FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI, tabelião, em sede recursal (fls. 134-142), suscitou preliminar de ilegitimidade passiva, uma vez que, sendo a responsabilidade dos notários e registradores subjetiva e indireta, o legitimado para figurar no pólo passivo é o Estado. Observou que a responsabilidade dos notários e registradores é regressiva, e somente nos casos de dolo ou culpa.
No mérito, admitiu o erro administrativo do CRVA ao dar início ao processo de transferência do veículo, lançando no sistema data de aquisição equivocada. Não teve o tabelião, no entanto, qualquer participação em tal conduta, uma vez que no Certificado de Registro de Veículo Automotor a data está correta. Ademais, a interpretação incorreta de sua caligrafia pelo funcionário do CRVA não é conduta que pode ser-lhe imputada. Citou as Leis n° 6.015/73, 8.935/94 e 9.492/97, asseverando acerca da ausência dos pressupostos ensejadores da responsabilidade civil.
O autor (fls. 150-155 e fls. 156-161) e o DETRAN (fls. 162-166) apresentaram contrarrazões.
Subiram os autos a este Tribunal e, com o parecer do Ministério Público (fls. 176-178), vieram à minha conclusão, para julgamento, em 18.01.2010 (fl. 179).
É o relatório.
VOTOS
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (PRESIDENTE E RELATORA)
DO CASO:
Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com ação de indenização promovida em desfavor do DETRAN - DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI, Tabelião de Notas. Por "caligrafia ilegível do funcionário do Tabelionato de Colorado/RS" (certidão de fl. 24) houve erro no registro da data de aquisição do veículo do autor, fazendo parecer que o bem tinha sido adquirido há mais de trinta dias sem registro. Com isso, o DETRAN lhe impôs penalidade (fl. 17).
Nesse contexto, o autor propôs a presente ação objetivando: a) o cancelamento da multa e da pontuação em sua CNH - Carteira Nacional de Habilitação (situação que foi regularizada durante o trâmite do processo, destaco); b) a devolução do valor da multa (R$ 127,69); e c) indenização por dano material e moral.
A sentença, de procedência parcial, rejeitou os pedidos de indenização, determinando apenas ao tabelião FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI que indenizasse o demandante do valor despendido com o pagamento da multa.
DO NÃO CONHECIMENTO APELO DO DETRAN / FALTA DE INTERESSE RECURSAL:
O DETRAN não sofreu condenação nenhuma, nem no mérito nem no que diz com a distribuição dos ônus da sucumbência, não possuindo, desse modo, interesse recursal. Observe-se que trouxe à baila, em seu recurso, questões preliminares e tangenciou o mérito da causa, nada referindo sobre os honorários de seu patrono - ponto em que se poderia cogitar interesse recursal -.
Não é de ser conhecido, desse modo, seu apelo.
DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO TABELIÃO:
Os argumentos trazidos à baila por tal réu para fundamentar a preliminar de ilegitimidade passiva - espécie de responsabilidade civil, se objetiva ou subjetiva - dizem, a toda a evidência, com o mérito da causa, e serão, portanto, com ele examinados.
DO MÉRITO:
Da combinação dos artigos 37, § 6° e 236 da Constituição Federal com o artigo 22 da Lei n° 8.935/95 extrai-se a responsabilidade objetiva dos tabeliães pelos atos próprios de serventia praticados por si ou seus prepostos. Nestes termos trago à baila o parecer ministerial de fls. 170-173, firmado pela DD. Procuradora de Justiça Dra. Tânia Maria Vieira Lorenzoni, que demonstra - até pelos arestos de jurisprudência colacionados - o entendimento desta Nona Câmara Cível sobre o tema. Vejamos então:
"Do apelo do Tabelião - Francisco Antônio Nicolini:
A responsabilidade dos tabeliães é objetiva, nos termos do disposto nos artigos 37, § 6° e 236 da Constituição Federal, bem como 22 da da Lei 8.935/94, não permanecendo qualquer dúvida quanto à responsabilização dos notários.
Transcreve-se:
Art. 37.
§ 6° - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos:
Na mesma esteira os seguintes arestos:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TABELIÃO. INOBSERVÂNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. CIÊNCIA DE CONTRATANTES A RESPEITO DA EXISTÊNCIA DE DEMANDA JUDICIAL SOBRE IMÓVEL OBJETO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE OS DANOS E A CONDUTA (OMISSÃO) DO RÉU. Prestando o tabelião serviço público por delegação do estado, sua responsabilidade é objetiva nos termos do art. 37, § 6º e 236 da CF. Precedentes jurisprudenciais. Na casuística, os danos apontados pelo autor referente a perda do bem imóvel que adquiriu não guardam relação causal com a atuação do notário, pois o prejuízo decorreu da conduta da vendedora que alienou o bem em duplicidade, sendo apenas o segundo registrado no álbum imobiliário. A falta de atendimento à liminar deferida para ciência da parte adquirente do negócio anterior com o autor, não é suficiente para identificar responsabilidade civil do tabelião, pois a ordem judicial se restringia a mera notificação, não impedindo a realização do negócio, conduta que foi ratificada pelo adquirente por ocasião da retificação da escritura pública. Ausente o nexo causal, não há dever de indenizar. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70026850545, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em 05/08/2009)
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO DO REGISTRO DE PROTESTO DE NOTAS PROMISSÓRIAS JÁ PRESCRITAS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO NOTÁRIO. ÔNUS DO CANCELAMENTO QUE RECAI SOBRE O DEVEDOR MEDIANTE APRESENTAÇÃO DE DECLARAÇÃO DE ANUÊNCIA EMITIDA PELO CREDOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 2º DA LEI Nº. 6.690/79 E PELO ART. 26 DA LEI Nº. 9.492/97. 1. RESPONSABILIDADE CARTORÁRIA. A jurisprudência do STF é pacífica no sentido de que, em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do artigo 236 da Constituição Federal, a responsabilidade é objetiva, tanto do Estado como do serventuário titular de cartório e registro extrajudicial. 2. ÔNUS DO CANCELAMENTO. Presente a necessidade de diferenciar duas situações no caso de permanência indevida do protesto junto ao Cartório: (a) aquela em que o aponte é oriundo de relação jurídica de direito material regida pelo Código de Defesa do Consumidor; (b) aquela em que o protesto fora lavrado em decorrência de dívida cuja origem desborda dos limites de uma relação consumerista. No primeiro caso, cabe ao credor a realização de todas as diligências necessárias para o cancelamento do protesto, após o pagamento do débito, ex vi dos artigos 43, § 3º, e 73, do CDC. No segundo, a obrigação do cancelamento do protesto após o pagamento efetuado extemporaneamente é ônus do devedor, conforme dispõe o art. 26 da Lei nº. 9.492/97 e o art. 2º da Lei nº. 6.690/79, que atribui a qualquer interessado, inclusive ao devedor, o ônus de requerer o cancelamento. 2. No caso em apreço, não se trata de relação consumerista, motivo pelo qual incumbia ao devedor, ou a qualquer interessado, solicitar o cancelamento do protesto. 3. Ora, não houve inobservância pelo tabelião dos preceitos legais (Lei nº. 9.492/97), nem ao efetivar o protesto (porquanto à época dos fatos as notas promissórias não estava prescritas), nem ao manter o registro (levando em conta a ausência de conduta culposa por ser ônus do devedor o levantamento do registro após o pagamento da dívida). APELAÇÃO PROVIDA. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70026226266, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 18/02/2009)
Em sendo objetiva a responsabilidade do tabelião, as circunstâncias fáticas que levaram ao equívoco na anotação registral junto ao DETRAN em nada alteram o ônus que recai sob o apelante, já que a Lei 8.935/94 é expressa ao determinar os Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos."
Nesse mesmo sentido a sentença, que vai mantida por seus próprios fundamentos, in verbis:
"(...) o dispositivo consagra a responsabilidade objetiva do Estado - independentemente de comprovação de culpa - pelos danos causados por seus agentes a terceiros por ato comissivo.
Aliás, a jurisprudência vem aplicando esse dispositivo inclusive para a responsabilidade civil do tabelião, como verte dos seguintes julgados, assim ementados, este do Supremo Tribunal Federal, aquele do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
"RESPONSABILIDADE OBJETIVA - ESTADO - RECONHECIMENTO DE FIRMA - CARTÓRIO OFICIALIZADO. Responde o Estado pelos danos causados em razão de reconhecimento de firma considerada assinatura falsa. Em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do artigo 236 da Constituição Federal, a responsabilidade objetiva é do notário, no que assume posição semelhante à das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos - § 6º do artigo 37 também da Carta da República." (RE 201595, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Segunda Turma, julgado em 28/11/2000, DJ 20-04-2001 PP-00138 EMENT VOL-02027-09 PP-01896) - grifo da subscritora.
"RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTRUMENTO DE PROTESTO LAVRADO POR TABELIÃO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO. ENDEREÇO ERRÔNEO. ALEGAÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL POR PARTE DO NOTÁRIO. AUSÊNCIA DE FALHA NO SERVIÇO. Pacificada no STF a tese de que, em se tratando de atividade cartorária exercida à luz do artigo 236 da Constituição Federal, a responsabilidade é objetiva, tanto do Estado como do serventuário titular de cartório e registro extrajudicial. No caso sub judice, no entanto, não restou caracterizada a prática de ato ilícito ou falha no serviço da Tabeliã, que agiu dentro dos limites preconizados pela Lei nº 9492/97. Dever de indenizar não reconhecido. Sentença mantida. APELO IMPROVIDO." (Apelação Cível Nº 70012531737, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Antônio Kretzmann, Julgado em 26/01/2006).
Em suma, a responsabilidade civil do Estado e de seus agentes é objetiva, isto é, independe de comprovação de dolo ou culpa. Sendo assim, a responsabilidade civil subjetiva do Estado exige comprovação de: (a) conduta; (b) dano; e (c) nexo de causalidade.
Quanto à conduta, o artigo 22 da Lei 8.935/94 reza que:
"Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos."
Dessa forma, mera análise visual na data de transferência veiculada no documento da fl. 13 basta para concluir-se por sua ilegibilidade, fato que, aliás, nem foi controvertido nos autos e desencadeou os demais acontecimentos descritos na exordial.
Não se olvida que o cotejo entre as datas de transferência e de reconhecimento de firma pudesse alterar o entendimento do agente de trânsito, porém o fato é que a grafia do algarismo exarado pelo tabelião demandado parece-se com um "1" e não com um "8", como seria o correto, o que foi ratificado pelo teor do documento da fl. 24.
E exigir ampla análise acerca do contexto que envolve uma informação que goza de fé pública soa como medida desproporcional aos propósitos de uma corriqueira fiscalização de trânsito. Logo, evidente que a conduta que originou os fatos em questão foi do tabelião demandado ou de seus prepostos, não havendo que se falar em fato praticado por servidor da autarquia.
Na verdade, em relação a essa ré, sem embargo existentes alegações de ato ilícito e de danos, as assertivas anteriores indicam a inexistência de nexo de causalidade que impede a responsabilização civil.
Ora, se toda a cadeia de fatos que culminou na imposição equivocada de penalidade ao autor (fl. 17) decorreu da "caligrafia ilegível do funcionário do Tabelionato de Colorado/RS", erro reconhecido na certidão de fl. 24, evidente está a responsabilidade do tabelião pela reparação dos danos perpetrados àquele.
DO DISPOSITIVO:
Por todo o exposto, não conheço do apelo do DETRAN e nego provimento ao apelo de FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS.
É o voto.
DES.ª MARILENE BONZANINI BERNARDI (REVISORA) - De acordo com a Relatora.
DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY - De acordo com a Relatora.
DES.ª IRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA - Presidente - Apelação Cível nº 70032035784, Comarca de Passo Fundo: "NÃO CONHECERAM DO APELO DO DETRAN E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO DE FRANCISCO ANTÔNIO NICOLINI / TABELIONATO DE NOTAS. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: ALESSANDRA COUTO DE OLIVEIRA.