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29 de Setembro de 2020
Artigo – Migalhas - Lei da Liberdade Econômica e controle judicial de contratos – Por Eduardo Costa Morelli
A bem sabida e fundamentada insatisfação da iniciativa privada com a excessiva intervenção do Poder Público na criação e desenvolvimento de suas atividades sempre gerou considerável insegurança no particular, o qual, diante de entraves burocráticos e legais, se vê, não raro, prejudicado e desestimulado à prática do empreendedorismo.
Assim, especialmente diante do presente quadro de crise econômica no Brasil, foi criada a medida provisória 881, de 2019, convertida na lei 13.874, sancionada em 20/9/19, com a finalidade de fomentar o crescimento, desenvolvimento e geração de emprego e renda com foco na iniciativa e prática liberal do empreendedorismo privado.
Conhecida como Lei da Liberdade Econômica, a lei 13.874/19 resgata o conceito liberal clássico de economia para propor relativo afastamento da intervenção estatal das relações privadas, flexibilizando normas de criação e manutenção da atividade empreendedora. É objeto deste artigo apresentar a parte da lei 13.874/19 criada para trazer maior segurança jurídica à manutenção judicial da atividade privada, relativamente à implementação de nova sistemática de interpretação do maior instrumento de manifestação da autonomia privada: o contrato.
Pois bem, a interpretação ganha especial relevo quando a lei ou o contrato possuem omissões, imprecisões e até contradições que permitem o uso das fontes do direito (em especial, os princípios gerais de direito) para direcionar a solução de eventual conflito travado em razão dessa insuficiência ou ambiguidade. É nesse contexto que ocorre a intervenção do Poder Público na relação entre as partes, por meio do processo judicial, presidido pelo(a) juiz(a) de direito, que é o agente público dotado de legitimidade para fazer o controle judicial da atividade econômica.
Um contrato de mútuo bancário, por exemplo, que tem sua taxa de juros remuneratórios estabelecida em patamar significativamente superior à taxa média de mercado, é considerado abusivo, ou seja, configura excessiva onerosidade e, portanto, é passível revisão pelo Poder Judiciário1. Observa-se, no caso, evidente conflito entre o princípio da autonomia privada, que traria a premissa de que o contrato deve ser cumprido porquanto firmado livremente entre partes capazes, e o princípio da função social do contrato, que, diante de excessiva onerosidade, concluiria pela abusividade e revisão da cláusula, visto que não há igualdade entre as partes e distribuição equilibrada de custos e benefícios.
Outro ponto que demonstra esse conflito de princípios no exemplo citado acima é a abertura deixada para o julgador mensurar o patamar significativamente superior à taxa média de mercado.
Sobre o critério para se considerar abusiva a taxa de juros remuneratória, o próprio STJ já firmou diversos posicionamentos: uma vez e meia2, ao dobro3 ou ao triplo4 da taxa média de juros. Ainda, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já firmou entendimento de ocorrência de abusividade em patamar superior a 20% da taxa média de mercado5. Temos também entendimento nos Tribunais de Justiça dos Estados do Rio Grande do Norte e Rio de Janeiro no sentido de que o mero fato de estar acima da taxa média de mercado já é suficiente para revisar a taxa de juros. Por fim também há posicionamento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no sentido de que não seria cabível sequer a revisão da taxa de juros do contrato, visto que a parte que contratou o empréstimo concordou com suas cláusulas por livre e espontânea vontade.
E você que lê este artigo, em qual patamar entenderia abusiva ou não a taxa de juros?
Ora, evidente, no exemplo citado, certo nível de discricionariedade interpretativa e valorativa do julgador no momento de aplicar critérios para revisar, ou não, o contrato, tanto pelos Tribunais Estaduais quanto pelo Superior Tribunal de Justiça. Essa intervenção prejudica a atividade empresarial, exatamente porque se torna impossível a avaliação e previsão dos riscos de se ter revisado em Juízo eventual contrato inerente ao desenvolvimento da atividade empresarial, o que mereceu atenção do legislador na promulgação da lei 13.874/19.
Criando dispositivos interpretativos que prestigiam a independência, o senso de responsabilidade das partes e o cumprimento dos contratos, prevendo a revisão apenas de maneira excepcional e limitada6, bem como estabelecendo a prevalência da intervenção mínima e subsidiária do Estado, mesmo as de ordem pública7, sobre o exercício das atividades econômicas8, a lei 13.874/19 representa exatamente um esforço para apresentar a resolução de dúvidas hermenêuticas de modo a prestigiar a autonomia da vontade9.
Porém, ainda é cedo para dizer acerca do alcance e efetividade da lei 13.874/19 no âmbito do Poder Judiciário e seu impacto na economia. Trata-se, em realidade, de esforço do legislador para criar um costume de responsabilidade e independência, evidentemente, com o fim de permitir às partes máxima segurança jurídica nas relações negociais.
Assim, especialmente diante do presente quadro de crise econômica no Brasil, foi criada a medida provisória 881, de 2019, convertida na lei 13.874, sancionada em 20/9/19, com a finalidade de fomentar o crescimento, desenvolvimento e geração de emprego e renda com foco na iniciativa e prática liberal do empreendedorismo privado.
Conhecida como Lei da Liberdade Econômica, a lei 13.874/19 resgata o conceito liberal clássico de economia para propor relativo afastamento da intervenção estatal das relações privadas, flexibilizando normas de criação e manutenção da atividade empreendedora. É objeto deste artigo apresentar a parte da lei 13.874/19 criada para trazer maior segurança jurídica à manutenção judicial da atividade privada, relativamente à implementação de nova sistemática de interpretação do maior instrumento de manifestação da autonomia privada: o contrato.
Pois bem, a interpretação ganha especial relevo quando a lei ou o contrato possuem omissões, imprecisões e até contradições que permitem o uso das fontes do direito (em especial, os princípios gerais de direito) para direcionar a solução de eventual conflito travado em razão dessa insuficiência ou ambiguidade. É nesse contexto que ocorre a intervenção do Poder Público na relação entre as partes, por meio do processo judicial, presidido pelo(a) juiz(a) de direito, que é o agente público dotado de legitimidade para fazer o controle judicial da atividade econômica.
Um contrato de mútuo bancário, por exemplo, que tem sua taxa de juros remuneratórios estabelecida em patamar significativamente superior à taxa média de mercado, é considerado abusivo, ou seja, configura excessiva onerosidade e, portanto, é passível revisão pelo Poder Judiciário1. Observa-se, no caso, evidente conflito entre o princípio da autonomia privada, que traria a premissa de que o contrato deve ser cumprido porquanto firmado livremente entre partes capazes, e o princípio da função social do contrato, que, diante de excessiva onerosidade, concluiria pela abusividade e revisão da cláusula, visto que não há igualdade entre as partes e distribuição equilibrada de custos e benefícios.
Outro ponto que demonstra esse conflito de princípios no exemplo citado acima é a abertura deixada para o julgador mensurar o patamar significativamente superior à taxa média de mercado.
Sobre o critério para se considerar abusiva a taxa de juros remuneratória, o próprio STJ já firmou diversos posicionamentos: uma vez e meia2, ao dobro3 ou ao triplo4 da taxa média de juros. Ainda, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já firmou entendimento de ocorrência de abusividade em patamar superior a 20% da taxa média de mercado5. Temos também entendimento nos Tribunais de Justiça dos Estados do Rio Grande do Norte e Rio de Janeiro no sentido de que o mero fato de estar acima da taxa média de mercado já é suficiente para revisar a taxa de juros. Por fim também há posicionamento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no sentido de que não seria cabível sequer a revisão da taxa de juros do contrato, visto que a parte que contratou o empréstimo concordou com suas cláusulas por livre e espontânea vontade.
E você que lê este artigo, em qual patamar entenderia abusiva ou não a taxa de juros?
Ora, evidente, no exemplo citado, certo nível de discricionariedade interpretativa e valorativa do julgador no momento de aplicar critérios para revisar, ou não, o contrato, tanto pelos Tribunais Estaduais quanto pelo Superior Tribunal de Justiça. Essa intervenção prejudica a atividade empresarial, exatamente porque se torna impossível a avaliação e previsão dos riscos de se ter revisado em Juízo eventual contrato inerente ao desenvolvimento da atividade empresarial, o que mereceu atenção do legislador na promulgação da lei 13.874/19.
Criando dispositivos interpretativos que prestigiam a independência, o senso de responsabilidade das partes e o cumprimento dos contratos, prevendo a revisão apenas de maneira excepcional e limitada6, bem como estabelecendo a prevalência da intervenção mínima e subsidiária do Estado, mesmo as de ordem pública7, sobre o exercício das atividades econômicas8, a lei 13.874/19 representa exatamente um esforço para apresentar a resolução de dúvidas hermenêuticas de modo a prestigiar a autonomia da vontade9.
Porém, ainda é cedo para dizer acerca do alcance e efetividade da lei 13.874/19 no âmbito do Poder Judiciário e seu impacto na economia. Trata-se, em realidade, de esforço do legislador para criar um costume de responsabilidade e independência, evidentemente, com o fim de permitir às partes máxima segurança jurídica nas relações negociais.