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G1 - Trisal do interior de SP consegue na Justiça direito de registrar filho com nome das duas mães e do pai: 'o amor vence todas as barreiras'
A família é de Bragança
Paulista (SP) e teve o bebê em abril de 2022. A decisão do Tribunal de Justiça
de São Paulo saiu no dia 5 de março.
Um trisal de Bragança
Paulista (SP), formado por duas mulheres e um
homem, conseguiu na Justiça o direito de realizar o registro multiparental do
filho, de 1 ano e onze meses, com o nome do pai e das duas mães da
criança. A família recebeu o parecer favorável no dia 5 de março.
Na decisão, o juiz André Luiz da
Silva da Cunha, da 1º Vara Cível de Bragança Paulista, argumentou que o
reconhecimento da parentalidade socioafetiva é um direito e que a mãe, que
ainda não tem o nome na certidão de nascimento, demonstrou exercer a maternidade
ao lado dos companheiros.
"Os documentos demonstram
que Priscila acompanhou a gestação e nascimento da criança, convive diariamente
com ela e acompanha e participa do seu desenvolvimento, exercendo, assim, as
funções inerentes à maternidade. Diante desse cenário, não há razão para negar
o reconhecimento da maternidade socioafetiva", disse o juiz na decisão.
O trisal é formado por Regiane
Gabarra, Priscila Machado e Marcel Mira. Regiane não tinha filhos e se uniu ao
casal quando eles já tinham filhos juntos. Os três estão juntos há mais de
cinco anos e, em 2021, decidiram
ser pais juntos, com uma gravidez planejada.
O
g1 mostrou que o bebê nasceu em abril de 2022,
mas a família não
havia conseguido registrar a criança no nome dos três pais em cartório e teve que fazer o registro apenas com o nome dos
pais biológicos Regiane e Marcel.
Após o episódio, a família entrou
na Justiça pedindo a inclusão do nome da segunda mãe, Priscila, o
que é permitido pela legislação, mas depende de autorização do juiz.
Em entrevista ao g1 nesta quinta-feira (7), Priscila, mãe que, até então,
não tem o nome na certidão de nascimento do filho, celebrou a conquista. Para
ela, a decisão da Justiça é um reconhecimento da maternidade que já é exercida
por ela todos os dias.
“Não tem como segurar a emoção,
era um grito que estava preso na garganta, mas agora posso falar que sim, eu
sou mãe dele. É emocionante, é como se encerrasse um ciclo, é um grito para o
mundo de que é possível sim ser filho de uma mãe que não gerou ele, mas que dá
carinho e educação. O amor é mais forte que o sangue, vence todas as
barreiras”, declarou emocionada.
Priscila narra que a conquista de
ter o nome dos três na certidão será benéfica para a criança tanto em questões
burocráticas como afetivas. Com o nome dela na certidão, Priscila vai poder
acompanhar o filho em emergências médicas no hospital, por exemplo.
“Uma experiência marcante foi
matricular meu filho na escola. Precisou do número de telefone da mãe no
cadastro. Eu falei que a secretária podia anotar o meu, mas ela olhou pra mim e
perguntou: ‘Você é o que dele?’ Eu disse que era mãe, mas pra ela não adiantava,
ela só podia colocar o telefone da mãe que estava na certidão, a Regiane”,
lembra.
“Eu preciso ser mãe dele não só
pra mim, mas pra todo mundo. Muita gente fala que é frescura, bobeira, que não
precisava, que eu queria aparecer, mas só quem sabe o quanto precisa somos nós.
É uma vitória para nós!”, afirmou alegre.
Ainda segundo Priscila, a espera
pela decisão da Justiça não foi fácil, mas o trisal vê a conquista deles como
uma forma de dar esperança para outros núcleos familiares que vivem uma
situação semelhante à deles.
“A espera vem junto com
ansiedade, foi uma espera ansiosa. Mas a vitória foi compensatória. Muitas
outras famílias, a partir desse reconhecimento, vão ter oportunidade e
esperança de lutar pelos seus direitos, tenho certeza”, disse.
“Eu sou mãe de quatro filhos. Se
me perguntarem qual eu mais amo, a resposta é que não tem diferença nenhuma do
amor que tenho pelos que saíram da minha barriga e os que não saíram. Faço a
mesma coisa por qualquer um deles. O amor é mais forte que o sangue, vence
todas as barreiras, não é clichê, é verdadeiro. Se tem amor, nada importa”,
concluiu.
Surpresa
A notícia de que havia recebido
parecer favorável na Justiça veio para Priscila por meio de uma surpresa. O
advogado da família, Diego Dall’ Agnol Maia, chamou ela para conversar e
entregou uma caixa de presente. Dentro da caixa, estava a decisão da Justiça.
Quando percebeu o que eram os papéis, Priscila não conseguiu segurar as
lágrimas - veja vídeo mais acima.
“Quando eu vi o resultado hoje ,
bateu uma emoção. Sou pai, minha família se constitui por meio de um programa
de adoção, então consegui entender, em certo sentido, o que eles estavam
passando, porque eu também fui dependente de uma sentença que consolidava minha
paternidade e a maternidade da minha esposa”, contou o advogado.
“Resolvi fazer a surpresa, porque
veio a reflexão, eu enquanto pai, como foi nosso momento de receber a notícia
na nossa vez. Veio um filme, o quanto era importante, a sentença parecia
formal, burocrática. Era importante conectar com essas famílias, porque o papel
tem um significado maior, é um verdadeiro presente, assim como o bebê foi um
presente na vida deles”, explicou.
Diego é advogado, professor
universitário e mestre em Direito, especialista em Direito Constitucional e
Administrativo. Ele conta que esse foi o primeiro caso que trabalhou para
inclusão de nomes de um trisal na certidão de nascimento.
Para ele, mais do que um
trabalho, a experiência se tornou uma missão de vida e ele pretende continuar
atuando em casos semelhantes.
“O tema em si foi o primeiro
processo que ajudei, não tinha tido nenhum caso como esse. Na minha percepção,
se fôssemos nos guiar dentro de uma luta específica do poliamor, poderíamos
sofrer um pouco mais, por vivermos em um estado conservador. Por isso, nosso
ponto guia era sobre o bebê ser amado e não os adultos em evidência, mas a
criança como personagem judicial, já que esse amor não cabe discussão”, disse.
“Tentamos sensibilizar o juiz,
para entender a dimensão do afeto que elas estavam carregando e buscando
naquele processo. Acho que a humanização para nós profissionais da Justiça é
fundamental, temos que deixar palavras difíceis de lado e nos conectar como ser
humano. Mais do que saber escrever direito, tem que saber escrever a história
daquela família e o que ela precisa”, concluiu.
O trisal agora precisa aguardar o
prazo legal de 15 dias úteis, para ir ao cartório e incluir o nome de Priscila
na certidão de nascimento do bebê.
Nas redes sociais, o trisal tem o
perfil 'Trisal
Amor ao Cubo' e compartilha a rotina com os
quatro filhos, os desafios da maternidade e fala sobre o poliamor.
Fonte: G1