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01 de Outubro de 2020

IBDFAM - Projeto Não Tenho Pai traz dados e histórias sobre paternidades ausentes

O livro-reportagem “Não tenho pai, mas sou herdeiro: Histórias e registros de paternidades ausentes” nasceu do desejo das jornalistas Alice Machado e Isabelle Chagas de investigar a rede complexa de afetos que envolve as relações entre pais e filhos. O projeto, que conta também com uma recente jornada de lives na internet, aborda o tema sob perspectivas jurídicas, psicológicas e comunicacionais.

A publicação traz entrevistas, depoimentos e textos com dados inéditos sobre o tratamento que é dado às paternidades ausentes na Justiça. De acordo com o estudo, o Brasil é um dos líderes no ranking de abandono paterno, com mais de 5 milhões de crianças sem o nome do pai em registro – além dos casos de abandono afetivo.

Segundo levantamento das autoras, em 2011, 66% de todos os mandados de prisão de Minas Gerais corresponderam ao não pagamento de pensão alimentícia, sendo que apenas 36,5% desse total foi cumprido. Nos anos posteriores, esse percentual foi ainda mais baixo: 2013 contabilizou 24,5% dos mandados cumpridos, enquanto em 2016 só 27% foram concretizados.

Vivências das autoras deu início ao projeto

Impulsionada por sua própria vivência, Isabelle Chagas se dedicou ao tema a partir de 2016, como tese de conclusão do curso de Jornalismo na Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. “Cresci sem ter acesso ou relação com meu pai, apesar de registrada por ele, mas isso não era conversado na minha família”, relata.

Na parceria com Alice Machado, ela teve acesso a uma outra configuração familiar. Juntas, as então estudantes puderam construir um projeto a partir de perspectivas que pareciam distantes. “O livro é composto por reportagens, relatos pessoais dos entrevistados, cartas e outros textos que flertam com estilos literários. Cada encontro e história pedia um tipo de texto”, detalha Isabelle.

Paternidade é atravessada por muitos fatores

Em uma jornada de lives promovidas no YouTube, as jornalistas ampliam e atualizam os estudos iniciados há quatro anos. Uma das transmissões teve a presença do advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Os encontros têm consolidado a percepção de que a paternidade é um fenômeno complexo e atravessado por muitos fatores.

“Há um noção de que, se não se convive com o pai, não existe paternidade. Nossa intenção é dar complexidade a esse tema, observando as diversas relações familiares. É possível construir uma paternidade que não trata só de presença física, mas de construção de uma história e do direito à origem, à memória e à identidade”, explica Isabelle.

Patriarcado

Falar sobre paternidade é falar também sobre patriarcado, que incide e impõe sofrimentos a homens e mulheres, segundo Isabelle. “Há aceitação e naturalização de que um pai não assuma o filho, o que não ocorre com as mulheres”, observa a jornalista.

As realidades das mães-solo estão entre as histórias contadas ao longo do projeto. A intenção é subverter a falácia de que a ausência de um pai produz filhos desobedientes e futuros criminosos – um discurso moralista, na opinião de Isabelle. “Ao mesmo tempo em que se naturaliza a ausência desses homens, fala-se que a mãe não dá conta sozinha, e a ausência de um pai acarreta inúmeros problemas.”

Desnaturalizar lugares prontos

Para Isabelle, a abordagem precisa perceber as várias aberturas possíveis a fim de pluralizar a discussão, quase sempre levada por uma via simplista e reducionista. “Não dá para olhar para dentro de uma caixinha. A paternidade se relaciona com as parentalidades, com as masculinidades e com as construções raciais, por exemplo”, destaca.

“Buscamos desnaturalizar os lugares prontos de que pai que é a lei, a mãe que precisa cuidar, ou mesmo de que o pai ausente é um grande vilão. Por vezes, a demonstração de afeto e o entendimento de que pode ser uma pessoa sensível nunca foi permitido ou apresentado a esses homens”, acrescenta.

Um dos encontros on-line teve a presença do professor Leandro Ferreira, do podcast AfroPai, que relaciona a paternidade com o racismo estrutural, com observações sobre os lugares de afeto e de família esperados do homem negro. “É preciso olhar a construção subjetiva daquela pessoa, o contexto em que está inserida, além das possibilidades e as imagens construídas para o lugar da paternidade”, defende Isabelle.

Clique aqui e baixe a versão digital do livro “Não tenho pai, mas sou herdeiro”.

Acesse o canal do projeto Não Tenho Pai, no Youtube, e assista às lives sobre o tema. Acompanhe também no Instagram (@nao.tenhopai).

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