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Provimento n. 147 do CNJ dispõe sobre a política permanente de enfrentamento à violência contra a mulher e adota protocolo envolvendo notários e registradores
PROVIMENTO
N. 147, DE 4 DE JULHO DE 2023
Dispõe sobre a política permanente de enfrentamento a todas as formas de violência contra a mulher, no âmbito das atribuições da Corregedoria Nacional de Justiça; adota protocolo específico para o atendimento a vítimas e recebimento de denúncias de violência contra a mulher envolvendo magistrados, servidores do Poder Judiciário, notários e registradores; cria canal simplificado de acesso a vítimas de violência contra a mulher na Corregedoria Nacional de Justiça e dá outras providências.
O
CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e
regimentais;
CONSIDERANDO
que compete ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ zelar pelo cumprimento dos
deveres funcionais dos membros
do
Poder Judiciário e pela observância do Estatuto da Magistratura e, para tanto,
expedir atos regulamentares, bem como receber e conhecer
as
reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus
serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de
serviços
notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou
oficializados, nos termos do art. 103-B da Constituição Federal;
CONSIDERANDO
o disposto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional, no Código de Ética da
Magistratura Nacional, na Resolução
CNJ
n. 135/2011, nos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial, no Código
Ibero-Americano de Ética Judicial e na Lei Federal n. 8.112/1990;
CONSIDERANDO
ser dever do Estado assegurar a assistência a todos os integrantes da família,
bem como criar mecanismos voltados
à
harmonização e pacificação em casos de litígio, nos termos do art. 226, § 8º,
da Constituição Federal;
CONSIDERANDO
ser atribuição do poder público desenvolver políticas para garantia dos
direitos fundamentais das mulheres nas
relações
domésticas e familiares, resguardando-as contra práticas de discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão, nos termos
do
art. 3º, § 1º, da Lei nº 11.340/2006;
CONSIDERANDO
que o Brasil é signatário da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência Contra a Mulher
–
“Convenção de Belém do Pará” (promulgada pelo Decreto n. 1.973, de 1º de agosto
de 1996), por meio do qual se comprometeu a incorporar,
na
legislação interna, normas penais, civis, administrativas e de outra natureza
que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência
contra
a mulher, bem como a adotar as medidas administrativas adequadas que forem
aplicáveis;
CONSIDERANDO
que o art. 4º, alínea “g”, da Convenção de Belém do Pará assegura à mulher o
“direito a recurso simples e rápido
perante
tribunal competente que a proteja contra atos que violem seus direitos”;
CONSIDERANDO
o que dispõe a Recomendação Geral n. 33 sobre o acesso das mulheres à Justiça,
do Comitê sobre a Eliminação
da
Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), no âmbito da Convenção das Nações
Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação
contra as Mulheres;
CONSIDERANDO
a Diretriz Estratégica 8 para o ano de 2023, da Corregedoria Nacional de
Justiça, aprovada no XI Encontro
Nacional
do Poder Judiciário, que dispõe: “Informar à Corregedoria Nacional as medidas
adotadas para o cumprimento da Recomendação n.
102/2021
(adoção do protocolo integrado de prevenção e medidas de segurança voltado ao
enfrentamento à violência doméstica praticada contra
magistradas
e servidoras)”;
CONSIDERANDO,
por fim, a necessidade de adequação do recebimento de denúncias de violência
contra a mulher, pela Corregedoria
Nacional
de Justiça, à Política Judiciária Nacional de Enfrentamento à Violência contra
as Mulheres (Resolução CNJ n. 254/2018) e às diretrizes
adotadas
pelo Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (Resolução CNJ n.
492/2023),
RESOLVE:
Art.
1º Estabelecer a política permanente de enfrentamento a todas as formas de
violência contra a mulher, no âmbito das atribuições
da
Corregedoria Nacional de Justiça, com a adoção de protocolo específico para o
atendimento de vítimas e recebimento de representações por
violência
contra a mulher envolvendo magistrados, servidores do Poder Judiciário e
prestadores de serviços notariais e de registro que atuem
por
delegação do poder público.
Art.
2º A política permanente de enfrentamento a todas as formas de violência contra
a mulher será guiada pelos seguintes princípios:
I
– respeito aos direitos fundamentais da vítima, em especial à sua privacidade,
o que impõe o sigilo das informações constantes em
procedimentos
que versem sobre violência contra a mulher;
II
– consentimento livre e esclarecido da mulher vítima de qualquer forma de
violência;
III
– eliminação de todas as noções preconcebidas e estereotipadas sobre as
respostas esperadas da mulher à violência sofrida e sobre
o
padrão de prova exigido para sustentar a ocorrência da agressão;
IV
– acesso desburocratizado da vítima aos procedimentos de competência da
Corregedoria Nacional de Justiça e atendimento
humanizado
condizente com as condições peculiares da mulher em situação de violência;
V
– nãorevitimização da ofendida, evitando-se sucessivas inquirições sobre o
mesmo fato, bem como questionamentos desnecessários
sobre
sua vida privada;
VI
– enfrentamento da subnotificação dos casos de violência contra a mulher quando
a apuração se inserir na competência da
Corregedoria
Nacional de Justiça, o que impõe ampla publicidade dos canais de acesso
disponíveis à vítima e das diversas redes de proteção
à
mulher;
VII
– capacitação de magistrados e servidores da Corregedoria Nacional de Justiça
com vistas ao enfrentamento de todas as formas de
violência
contra a mulher e à atuação segundo o protocolo de julgamento com perspectiva
de gênero; e
VIII
– interlocução permanente com ouvidorias, fóruns, núcleos e comitês correlatos
do CNJ e dos tribunais da Federação.
Art.
3º Sem prejuízo da atuação dos respectivos Tribunais e Corregedorias locais,
poderão ser reportadas à Corregedoria Nacional de
Justiça,
na forma estabelecida por este Provimento, situações de violência contra a
mulher praticadas por:
I
– magistrados, relacionadas ou não com o exercício do cargo;
II
– servidores do Poder Judiciário, quando violadoras de deveres e proibições
funcionais (arts. 116 e 117 da Lei n. 8.112/1990);
III
– prestadores de serviços notariais e de registro, quando relacionadas ao
exercício do serviço delegado.
Parágrafo
único. Aplicam-se as disposições deste artigo a outras situações de violência
quando:
a)
embora não tenham sido praticadas diretamente por magistrados, haja indicativo
de omissão quanto aos deveres de cuidado pela
integridade
física e psicológica da vítima, na forma da Lei n. 14.245/2021 e da Lei n.
14.321/2022 (violência institucional); e
b)
de alguma forma, possam repercutir no pleno exercício das atribuições de
magistradas e servidoras do Poder Judiciário, observado
o
previsto no § 3º do artigo 4º.
Art.
4º Será criado, no sítio eletrônico do CNJ (no âmbito da Corregedoria Nacional
de Justiça), portal específico da política permanente
de
enfrentamento a todas as formas de violência contra a mulher, o qual deverá
conter, no mínimo:
I
– formulário simplificado para encaminhamento de representações à Corregedoria
Nacional de Justiça por violência contra a mulher,
nos
limites estabelecidos no art. 3º deste Provimento; e
II
– conteúdo informativo acerca das atribuições da Corregedoria Nacional de
Justiça no enfrentamento a todas as formas de violência
contra
a mulher.
§
1º A possibilidade de formulação de representações prevista no inciso I não
exclui outras formas tradicionais de peticionamento no
âmbito
da Corregedoria Nacional de Justiça.
§
2º O formulário de que trata o inciso I deverá conter, além de linguagem
simplificada e humanizada, dados que permitam a formulação
de
estudos estatísticos acerca do perfil das demandas, observado o sigilo previsto
no inciso I do art. 2º.
§
3º Caso a apuração dos fatos reportados não seja de competência da Corregedoria
Nacional de Justiça, a vítima receberá orientação
acerca
das vias adequadas para a formulação de sua demanda.
§
4º Será disponibilizado link para acesso direto ao formulário de que trata o
art. 4º, inciso I, à Ouvidoria Nacional da Mulher e ao Comitê
de
Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral e do Assédio Sexual e da Discriminação
no Poder Judiciário, bem como aos demais comitês
e
comissões que tratem do tema da violência contra a mulher no âmbito do CNJ,
visando à adoção das medidas previstas neste Provimento
de
forma célere e eficaz.
Art.
5º As representações por violência contra a mulher recebidas pela Corregedoria
Nacional de Justiça, por quaisquer vias, receberão
tratamento
específico conforme protocolo de julgamento com perspectiva de gênero
(Resolução CNJ n. 492/2023), com a adoção, entre outras,
das
seguintes diretrizes:
I
– não será exigida prova pré-constituída dos fatos alegados como requisito de
procedibilidade da representação;
II
– o procedimento poderá ser integralmente instruído no âmbito da Corregedoria
Nacional de Justiça, com colheita de documentos,
arquivos
e oitiva de testemunhas indicadas pela representante e demais interessados;
III
– a representante será sempre indagada se deseja ser ouvida previamente, de
preferência, por uma juíza auxiliar da Corregedoria
Nacional
de Justiça, para reportar os fatos com maior detalhamento;
IV
– em caso de necessidade e concordância da vítima, esta poderá ser encaminhada
a atendimento de apoio psicossocial oferecido por
um
órgão judicial de sua preferência, que poderá elaborar estudo a respeito da
dinâmica de violência a que estiver exposta, dos riscos porventura
ainda
existentes e de quaisquer outros aspectos relevantes à compreensão dos fatos
alegados;
V
– instaurado procedimento a partir do formulário de que trata o art. 4º, inciso
I, constará na autuação a Corregedoria Nacional de Justiça
como
requerente, com imputação de sigilo em todos os casos.
§
1º Na oitiva de que trata o inciso III, o(a) magistrado(a) que conduzir o ato
auxiliará a vítima, se for o caso, a preencher o Formulário de
Avaliação
de Risco aplicável, conforme as diretrizes da Resolução Conjunta CNJ/CNMP n.
5/2020 e da Lei n. 14.149/2021.
§
2º A oitiva da vítima, das testemunhas e do agressor será registrada em meio
eletrônico, devendo a mídia integrar os autos do
procedimento.
Art.
6º Sem prejuízo do poder de requisição previsto no art. 8º, inciso VII, do
Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça - RICNJ,
a
Corregedoria Nacional de Justiça poderá celebrar termos de cooperação com os
tribunais ou outros órgãos públicos para o compartilhamento
de
pessoal e de serviço psicossocial ou multidisciplinar especializados em
violência contra a mulher, para fins do que dispõe o inciso IV do art.
5º
deste Provimento.
Art.
7º Recebida a representação e analisados os elementos colhidos pela Corregedoria
Nacional de Justiça, não sendo caso de
arquivamento,
o procedimento tramitará conforme a Resolução CNJ n. 135/2011 e o RICNJ.
Art.
8º Este provimento entra em vigor na data de sua publicação.
Ministro
LUIS FELIPE SALOMÃO
Corregedor
Nacional de Justiça
Fonte:
Diário Oficial da Justiça do CNJ